Fundada por imigrantes japoneses, Assaí, no Norte do Paraná, recebeu de braços abertos o fundador do ICF, John Jung. O município aposta na educação para se tornar uma das comunidades mais inteligentes do mundo. Crédito: Fernando Henrique de Oliveira.
Uma das sete comunidades mais inteligentes do mundo, Assaí (PR) recebe criador do conceito e revela como apostar nas pessoas é o maior legado da inovação
Fernando Henrique de Oliveira
13/09/2024 19:33
Talvez, John Jung nunca tenha tido recepções tão calorosas como as que teve em Assaí. O fundador do Intelligent Community Forum esteve no pequeno município da Região Metropolitana de Londrina, no Norte Pioneiro do Paraná, na última semana para conhecer de perto aquela que é uma das sete finalistas ao título de comunidade mais inteligente do mundo de 2024.
Talvez, ainda, estar no Top7 das comunidades mais inteligentes do mundo do ICF também seja uma das maiores conquistas que Assaí tenha tido nos últimos anos, apesar de estar colecionando prêmios nacionais desde 2023. O mais recente dentre eles foi a conquista da categoria Empreendedorismo da Escola na 12ª edição do Prêmio Sebrae Prefeitura Empreendedora (PSPE), realizada em junho deste ano.
E foi justamente nas sete escolas que visitou na cidade entre quinta (5) e sexta-feira (6) que Jung experimentou as mais entusiasmadas recepções em seus muitos anos à frente do ICF. Em uma após a outra, ele era recebido sob fortes aplausos dos alunos. "Já havia sido recepcionado dessa forma em escolas de Taiwan, China e Índia, mas não com a mesma frequência em uma única cidade. De forma geral, Assaí está entre os lugares que mais calorosamente me receberam", contou Jung depois.
É também nas escolas que Assaí concentra boa parte das suas inovações, com projetos nas áreas de tecnologia, robótica, manejo agrícola, sustentabilidade e combustível renovável. Um exemplo é um projeto de fabricação de biodiesel a partir de óleo de cozinha usado, liderado e patenteado por quatro alunas do ensino médio da cidade, que tem contribuído para a renovação energética ao oferecer uma alternativa sustentável ao combustível utilizado no transporte escolar público.
A iniciativa foi uma das que mais impressionaram Jung. Para ele, para além do mérito das alunas, o projeto é uma prova de como uma cidade pode se beneficiar ambiental e economicamente quando existe engajamento da comunidade em ações que contribuem para o desenvolvimento sustentável.
A inovação não se resume apenas à implementação de tecnologia, mas se estende à criação de talento e ao desenvolvimento de uma força de trabalho a partir do conhecimento. E isso começa com a educação. Cidades realmente inteligentes investem na população e criam uma comunidade engajada e diversificada, garantindo prosperidade e alta qualidade de vida. O sucesso de uma sociedade inovadora depende do envolvimento ativo da comunidade, na qual todos devem estar engajados e incluídos no processo
, disse o fundador do ICF no discurso que proferiu durante um jantar para convidados e autoridades na quinta-feira.
Assaí: apostando no capital humano para crescer
Segundo o secretário municipal de ciência, tecnologia e inovação, Igor Oliveira, Assaí tem um diferencial na forma como conduz seus processos, tanto no desenvolvimento econômico quanto na formação de pessoas.
Isso não é exclusivo da nossa cidade, mas o trabalho que mostramos ao John é resultado de um esforço coletivo. Ele envolve a mudança na rotina dos alunos desde a educação infantil, com foco em criar caminhos diferentes e inovadores. Nosso master plan é uma agenda de longo prazo, e nossa preocupação principal é transformar a educação, aproveitando todas as oportunidades que a cidade oferece
, revela.
"Temos acesso fácil a colégios estaduais e universidades, o que nos permite trabalhar diretamente com as instituições de ensino. Essa integração com escolas e instituições de ensino superior no Paraná gerou um sentimento de pertencimento entre os alunos e começamos a ver resultados positivos. O projeto do biodiesel é um deles", conta.
A gestão municipal consolidou parcerias importantes com instituições educacionais do estado na cidade e universidades da região, dente elas a Universidade Estadual de Londrina que, no prazo de um ano, conforme previsão, terá um campus em Assaí, com a oferta de sete cursos, dentre eles graduações em inteligência artificial, engenharia da computação, agronomia e engenharia civil. A colaboração tem permitido ao município capacitar de forma promissora seus alunos com o auxílio da prefeitura.
Este movimento em prol da educação como geradora da inovação tem ganhado força nos últimos três anos, de acordo com o prefeito de Assaí, Tuti Bomtempo, e gerado resultados expressivos para o município.
A integração com escolas municipais e estaduais, bem como com universidades estaduais e federais, criou um ambiente altamente propício para o desenvolvimento das nossas crianças e jovens, bem como na nossa comunidade. Essa colaboração, alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, que seguimos aqui, está criando oportunidades e acendendo uma luz para muitas crianças, oferecendo a possibilidade de um futuro promissor
, comenta o prefeito.
Construção coletiva
Bomtempo, que está em seu terceiro mandato, diz que os esforços atuais estão voltados para a criação de um ambiente em que os alunos se desenvolvam a um ponto em que possam também contribuir para o progresso do município.
Filho de professores, ele tem na construção de uma educação sólida uma das suas bandeiras. Quando perguntado se esse é o legado que quer deixar para a cidade, Bomtempo diz que tudo o que Assaí tem vivenciado hoje é fruto de uma construção coletiva, que envolve muitas pessoas e uma comunidade engajada. "Eu apenas participo disso e comemoro as conquistas de cada um", conta.
O prefeito também destaca a parceria com o governo do estado para a construção desse ambiente que dá sinais de ser favorável para o desenvolvimento da educação. Presente no mesmo jantar em homenagem a Jung na noite de quinta-feira, o secretário da inovação, modernização e transformação digital do Paraná, Alex Canziani, destacou como a gestão municipal "sonha grande e valiosamente para o seu povo, para suas crianças, investindo fortemente na educação e buscando parceiros para transformar Assaí".
Em sua vida pública, Canziani também teve na educação uma das suas bandeiras. Ao ressaltar o seu papel no desenvolvimento da cidade, ele diz que é assim que ela se desenvolve e se modifica. E é este caminho, diz Igor Oliveira, que tem levado a secretaria municipal de inovação a apostar nos projetos de Assaí e apresentá-los ao mundo.
"Assaí, hoje, tem seus 92 anos, mas só há dois ela está neste movimento de se abrir para mostrar o seu desenvolvimento para o país e fora dele", diz.
Caminho para a inovação
O movimento de Assaí a iguala ao de outras pequenas cidades pelo mundo que atingiram patamares de desenvolvimento que fizeram delas comunidades inteligentes segundo John Jung. Stratford, na província de Ontário, no Canadá seria uma delas. Binh Duong, no Vietnã, também.
"Há uma particularidade em relação a Binh Duong. Há 25 anos, ela era uma comunidade essencialmente rural, como Assaí. Mas eles quiseram melhorar, atrair investidores, trazer compradores para a cidade. Ou seja, queriam inovar. Para isso, sete anos atrás, foram aprender com Eindhoven, na Holanda, como fazer isso. Eindhoven havia chegado ao título de comunidade mais inteligente do mundo. Binh Duong passou a trabalhar, então, com a Holanda e Singapura para realizar mudanças estruturais importantes. Singapura, por exemplo, os ajudou a construir universidades e um ambiente para criação de startups. Em sete anos, a cidade rural do Vietnã ganhou hotéis, centros de comércio mundial e instalações para convenções. Toda a infraestrutura criada fez a inovação chegar à cidade. Mas tudo isso começou a partir da educação, com novas universidades. Hoje, eles são uma comunidade mais inteligente porque se desenvolveram", conta.
Jung diz que, agora, Assaí precisa criar condições de prosperar ainda mais. Oliveira acrescenta que novos esforços estão sendo feitos neste sentido para além do fato de a comunidade, que surgiu e se desenvolveu a partir da imigração japonesa, já investir, também, em parcerias estratégicas com grandes empresas e manter o foco no desenvolvimento de talentos. Esse compromisso com o aprimoramento do capital humano reforça, segundo o secretário, o papel da cidade no desenvolvimento coletivo e na criação de um impacto positivo contínuo.
Um dos exemplos é a Lei do Passaporte Estudantil, lançada neste ano. Com ela, a prefeitura de Assaí vai conceder bolsa de estudos para alunos da cidade que se aplicarem em universidades da região em cursos como agronomia, engenharias, tecnologia e enfermagem. No caso das universidades particulares, o município irá custear integralmente as mensalidades, além de auxiliar no transporte dos jovens até as instituições. Para o caso de alunos aprovados em universidades públicas fora do município, será destinado um subsídio mensal para ajudá-los a permanecer nessas cidades.
A perspectiva é conseguir atender 100 alunos por ano. Baixa renda, público feminino e nota do ENEM são alguns dos requisitos que serão aplicados para a seleção dos estudantes. "Hoje, formamos entre 160 e 170 jovens no ensino médio. No último ano, 104 deles aplicaram para o ENEM e foram aprovados em vestibulares públicos. Com o programa, vamos atender este público, confiantes no sucesso deles", afirma Oliveira.
Jung também espera que os alunos de Assaí sejam bem-sucedidos ainda mais. Para alguns deles, em uma das escolas de ensino fundamental e médio da cidade, ele deixou uma mensagem, gravada em um quadro de giz: "Lembrem-se de ser mais que 'smart'; sejam inteligentes".