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Thiago Maceira

Thiago Maceira é Managing Director no Banco de Investimentos e Head do Núcleo Tech do Itaú BBA. Com 20 anos de experiencia no mercado financeiro e no Itaú BBA desde 2013, o executivo já trabalhou na Goldman Sachs no escritório de Nova Iorque e no Citigroup em São Paulo. Thiago é bacharel em Economia pela Universidade de São Paulo e possui MBA pela Columbia Business School (prêmio Beta Gamma Sigma Alumni). Na coluna “Investimentos e Startups”, falará sobre as tendências do ecossistema de tecnologia sob o ponto de vista de investimentos.

Proptechs

O que são proptechs e como elas estão transformando o setor imobiliário

24/07/2020 14:00
Com a taxa de juros em níveis historicamente baixos e o déficit habitacional ainda relevante no país, diversas startups estão revolucionando o mercado imobiliário com inovações e capital para transformar a maneira que o brasileiro mora, trabalha e escolhe seu imóvel.
Para discutir este tema, convidei na coluna deste mês o analista do time de research do Itaú BBA, Enrico Trotta. Enrico está especialmente bem posicionado para falar sobre este tema, pois estuda tanto o mercado imobiliário quanto as tendências disruptivas da tecnologia em diversos setores.
Leia abaixo um resumo das perguntas que fiz ao Enrico neste bate-papo sobre a intersecção da tecnologia com o mundo do tijolo.
Quais são as principais tendências de tecnologia para o setor imobiliário?
Digitalização é algo que veio para ficar no cenário pós-pandemia e esse processo deve se acelerar no Brasil, inclusive no setor imobiliário. Surpreendentemente, as incorporadoras residenciais conseguiram manter um nível de vendas satisfatório durante a quarentena usando apenas o método de venda online, dado que os estandes de venda foram fechados.
Como referência, a Loft recentemente concluiu a venda de uma unidade residencial digitalizando todo o processo de compra e venda. Outras incorporadoras investiram no canal de venda online e perceberam que os gastos com estandes de venda físico podem ser menores, por exemplo.
Do lado de shoppings, empresas terão que acelerar o movimento de integração das vendas online com o ambiente físico, desenvolvendo estratégias de implementação de Omni-Channel para capturar o crescimento de e-commerce no país, e conectando o varejo físico com os grandes marketplaces do Brasil.
Por fim, o futuro do setor passa por novas tecnologias que envolvem blockchain para contratos, big data e inteligência artificial para integrar os diversos canais, com o intuito de entender melhor o comportamento do consumidor e acelerar a eficácia do processo de compra e venda, diminuindo custos transacionais.
O home office é uma tendência que foi testada e aparentemente aprovada pela maioria das pessoas. Como você projeta o impacto disso para o mercado imobiliário residencial? Você falou do impacto do Covid-19 na digitalização. Quais são as tendências para habitação pós-Covid e quais novos conceitos de moradia têm surgido com o uso de tecnologia?
De acordo com uma pesquisa realizada pela Cushman & Wakefield (Pesquisa de Home Office e Tendências de Ocupação Imobiliária) com mais de 120 executivos de 16 setores diferentes, 84% dos entrevistados aprovam a nova forma de trabalhar, enquanto 74% das empresas pretendem adotar, manter ou ampliar as políticas para home office após a pandemia. Dentro desse cenário, fica cada vez mais evidente que o home office veio para ficar e a prática deve se tornar cada vez mais comum no dia a dia das empresas brasileiras.
O conceito de moradia e habitação foi reavaliado pelas pessoas no período em que ficaram em casa durante a quarentena e vemos duas tendências potenciais, centralizadas nos segmentos de média-alta renda: primeiro, a mudança na dinâmica de preço e localização dos imóveis; e segundo, crescimento e evolução do conceito de segunda residência.
Com relação à primeira mudança potencial, a tendência crescente do home office deve gerar um incremento na demanda por imóveis em localizações mais afastadas do centro urbano (em especial em condomínios com infraestrutura), nos quais é possível adquirir um imóvel residencial com maior área útil por um preço por metro quadrado mais acessível.
Com a adesão ao home office, torna-se menos necessário estar perto do escritório como uma das alternativas para se contornar o caos urbano e a carência de mobilidade urbana das grandes cidades. Isso afeta também a demanda e dinâmica de preços de imóveis em regiões hoje consideradas mais nobres e sobrevalorizadas.
Outra tendência potencial é a de segunda residência, conceito que atualmente é muito incipiente no Brasil mas que é mais desenvolvido em mercados imobiliários mais consolidados como o dos Estados Unidos. Com uma maior flexibilização do trabalho remoto, as famílias podem optar por ter uma segunda moradia em regiões mais afastadas da grande cidade, ao mesmo tempo em que sustentam um imóvel residencial de menor metragem perto do centro urbano.
Por fim, o cenário de juros baixos no Brasil aliado à crescente adesão de tecnologia vem destravando o potencial do setor imobiliário e permitindo que novas modalidades de moradia sejam economicamente viáveis.
Dentre essas modalidades, uma das que mais tem se destacado é a do segmento de locação residencial, com incorporadoras desenvolvendo imóveis residenciais focados em renda (MRV recentemente criou a Luggo, com foco em desenvolvimento de unidades para locação no baixa-renda), e proptechs inserindo o conceito de habitação compartilhada (co-living), como Yuca e Vitacon.
E qual o impacto que essa tendência deve trazer para o segmento de lajes corporativas e escritórios no médio prazo?
Nessa pesquisa feita pela C&W, quase um terço dos executivos entrevistados responderam que suas empresas devem reduzir espaço de escritório no futuro devido ao sucesso do home office. Essa tendência deve frear momentaneamente a recuperação do mercado de lajes corporativas da cidade de São Paulo, que vinha em franca ascensão com o aquecimento da economia.
Um exemplo recente e icônico do potencial impacto que home office pode trazer para o segmento de lajes corporativas foi o anúncio da XP em migrar sua sede para o interior e a adoção do trabalho remoto total até dezembro. Com a medida, é esperado que a empresa retorne parte de seu espaço ocupado nas torres triple-A do edifício corporativo São Paulo Corporate Towers.
O cenário é ainda muito incerto dado que não sabemos o que de fato será o “novo normal”, mas fica claro que o home office deve fazer com que a absorção líquida de escritórios diminua e a recuperação de vacância na cidade seja gradual.
Como tem sido o interesse dos fundos de venture capital por proptechs no Brasil? E com relação ao interesse de investidores pelos players imobiliários listados na Bolsa?
O investimento de fundos de venture capital em proptechs começou a ganhar notoriedade a partir de 2015, quando o segmento atingiu a marca de 1.3 bilhão de dólares globalmente, impulsionado fortemente por países como Estados Unidos e China, berço de grande parte dos unicórnios mundiais.
No Brasil, o movimento é mais recente com os investimentos de venture capital crescendo exponencialmente a partir de 2017. Como ilustração, mais de 800 milhões de dólares já foram investidos em proptechs brasileiras desde 2011, com os últimos quatro anos representando metade do número de transações e 92% do montante total. Nessa onda, vimos no Brasil o surgimento de dois unicórnios no setor com Quinto Andar e, mais recentemente, Loft.
O interesse dos fundos de venture capital por proptechs deve continuar crescendo no Brasil, seguindo o volume recorde de investimentos realizados em 2019 (US$ 444 milhões).
O setor imobiliário no Brasil tem um mercado endereçável gigantesco e ainda está no seu contato inicial com tecnologia, sendo que boa parte das proptechs ainda foca em resolver as dores envolvidas no processo de intermediação imobiliária residencial.
As oportunidades são vastas, especialmente nos segmentos de gestão condominial e digitalização do setor. Por outro lado, ainda vemos alguns segmentos sofrendo no curto prazo como o de coworking, por exemplo, dado que espaços compartilhados devem continuar a serem evitados no cenário pós-quarentena.
Na bolsa brasileira, os investidores ainda têm poucas opções para capturar as tendências de tecnologia do setor imobiliário, mas temos visto recentemente um movimento de migração investimentos dos segmentos de shoppings e lajes corporativas para os de residencial e galpões logísticos. Do lado de shoppings, a perda de atratividade do segmento é explicada em parte pelo esperado crescimento acelerado de e-commerce no país pós-Covid, que potencialmente devem trazer um impacto negativo para as vendas físicas.
Por outro lado, os galpões logísticos surfam a onda positiva do e-commerce dado que os varejistas precisam de áreas bem localizadas para armazenar seus produtos e entrega-los no menor custo e tempo possíveis. Nos escritórios, o interesse menor vem da preocupação que citamos relacionada ao impacto do home office.