Na semana passada, a fabricante chinesa de smartphones Xiaomi anunciou ao público que vai produzir carros elétricos. A nova subsidiária, chamada de Xiaomi EV Company Limited (ou Xiaomi Qiche, para os chineses), tem capital inicial de 10 milhões de renminbi (ou US$ 1,5 bilhão) e será comandado pelo executivo da casa Lei Jun. O foco da nova empresa é fabricar e desenvolver veículos de energia (EV, na sigla em inglês) alternativa e seus componentes. Ou seja, motores, máquinas e equipamentos elétricos, além de baterias de lítio e softwares.
É um mercado bem promissor. Na China, estima-se que há pelo menos seis milhões de carros e caminhões elétricos rodando nas cidades e estradas, e os números vão aumentar ainda mais com a entrada de novos players de tecnologia e montadoras. Por aqui, o caminho ainda é longo. A Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) calcula que, em 2020, a frota total de automóveis elétricos puros ou híbridos (elétrico + combustível fóssil) em circulação chega a 42 mil unidades.
Mais por questões políticas do que econômicas, grandes fabricantes chinesas de celulares começam a diversificar os negócios para sobreviver. O motivo, já conhecido, é que tanto a Xiaomi como a sua grande concorrente doméstica Huawei estão proibidas de usar tecnologias e componentes de comunicação desenvolvidas - ou parcialmente desenvolvidas - por empresas americanas. E sem essas peças, não há como os chineses produzirem smartphones de última geração.
Por sua vez, a Huawei, outrora líder mundial de celulares, dá os primeiros passos em tecnologias de internet das coisas (IoT, em inglês). Nesse campo de batalha, a desenvolvedora chinesa pode se sair melhor, visto que os smart devices, como smartwatches, TVs, geladeiras, ar-condicionado e eletrodomésticos, não dependem de chips tão sofisticados como os de celulares. Basta equipar os aparelhos inteligentes com internet e conectividade, tarefa que os chips mais baratos podem executar com eficiência.
Para isso, a Huawei lançou em junho o seu sistema operacional Harmony OS, visto que não poderá usar o iOS ou Android em seus aparelhos. Elogiado por programadores por ser intuitivo e fácil de instalar, não há dúvidas que o sistema proprietário da Huawei vai atrair desenvolvedores e, portanto, garantir competitividade doméstica. Mesmo sem competir com os dois grandes sistemas operacionais do mundo, o Harmony será instalado em 300 milhões de dispositivos da Huawei até dezembro – o que é um volume bem significativo.
Outra frente aberta pela Huawei é o licenciamento de tecnologias 5G em celulares. Dona do maior portfólio de tecnologias 5G do mundo, a Huawei vai cobrar US$ 2,5 em royalties por cada aparelho que utilizar seus componentes. Isso inclui a Apple e a Samsung.
De acordo com a GreyB, empresa de pesquisa de propriedade intelectual, mais de 18% das patentes da Huawei são consideradas essenciais para o padrão 5G. Ou seja, se os fabricantes mundiais de smartphones quiserem usar as patentes essenciais padrão (ou SEPs, em inglês) de 5G, terão que pagar a licença para a Huawei – ou fabricar sua própria tecnologia, o que não vai acontecer de um ano para outro.
Se no campo dos celulares as fabricantes chinesas estão em desvantagem, ao menos elas estão conseguindo abrir outras frentes em setores onde são muito competitivas. A Xiaomi tem muito conhecimento acumulado em baterias, o que muitos garantem ser o coração e o futuro da indústria de veículos elétricos e autônomos. Quando as baterias de carros oferecerem a mesma autonomia para os motores elétricos do que a dos carros a combustão, em termos de quilometragem, darão um passo decisivo para serem dominantes na indústria automobilística.
E a Huawei está fazendo valer a sua liderança em 5G, tecnologia essencial para o desenvolvimento dos dispositivos eletrônicos do futuro. Diante de tantas movimentações no mercado, as empresas chinesas têm tudo para se reinventar e continuar muito relevantes.