
Thiago Muniz
Thiago Muniz é CEO da Receita Previsível Consultoria, professor na FGV em todo o Brasil de marketing e vendas e mentor de negócios.
Os dados ajudam — muito. Mas não antecipam tudo.
O que os números não revelam: Por que CEOs e diretores ainda utilizam a intuição para tomar decisões?
Imagine um piloto experiente que segue o GPS sem questionar. Ele ignora a própria experiência, confia cegamente na tecnologia e, de repente, se vê em um trânsito caótico. Parece absurdo, né? Mas é exatamente isso que acontece com empresas que tomam decisões 100% baseadas em dados sem considerar a intuição e a experiência.
Nos últimos anos, a obsessão por números criou um problema sério: quanto mais métricas e KPIs surgem, mais as empresas terceirizam o pensamento estratégico.
E aqui está o ponto: os dados ajudam — muito. Mas não antecipam tudo.
Eles são como um retrovisor com estatísticas. Mostram o que já aconteceu, ajudam a calcular probabilidades, mas não têm a sensibilidade para perceber uma curva inesperada na estrada.
E em um mundo imprevisível como o que vivemos hoje, confiar só nisso pode travar a criatividade, matar a ousadia e criar uma empresa que só sabe operar no modo “seguro”.
A análise preditiva avança, sim. Mas o verdadeiro desafio não é técnico. É filosófico: quando o dado vira viés? Quando, em vez de expandir a visão, começa a limitar o olhar?
O paradoxo da automação
Os dados prometeram mais precisão e menos erros. Mas a realidade é outra. A Netflix despejou milhões em "House of Cards" porque os números indicavam que daria certo. Mas foi a intuição que fez "Stranger Things" se tornar um fenômeno, mesmo não seguindo padrões estatísticos evidentes.
O mesmo aconteceu com o Airbnb. Os dados mostravam que apartamentos em centros urbanos eram os mais procurados. Mas a intuição levou a empresa a testar algo novo: experiências autênticas, como dormir em uma casa na árvore ou em um iglu. E isso explodiu.
Nenhuma planilha teria previsto esse comportamento.
Se os dados fossem infalíveis, todo mundo teria previsto o Boom da IA: ChatGPT, Claude, DeepSeek. Mas ninguém previu.
A real? Quem só segue dados, sem usar a própria cabeça, não enxerga as oportunidades que apenas a mente criativa humana consegue prever.
Será que a IA teria pensado no McDonald's? Os dados diziam que restaurantes tradicionais funcionavam bem. Mas alguém percebeu que velocidade, padronização e marketing agressivo poderiam criar um império de fast food.
Ou no Starbucks? Os números apontavam que café era só uma bebida, mas alguém viu que podia ser uma experiência.
O iPhone? Se dependesse dos dados, a Apple teria feito um celular com teclado físico como os BlackBerrys da época. Mas foi a intuição de Steve Jobs que enxergou que uma tela inteira sensível ao toque mudaria tudo.
A Netflix? Os números diziam que as pessoas alugavam DVDs, mas alguém percebeu que o futuro estava no streaming.
E o Uber? Os dados indicavam que táxis eram o único jeito de se locomover nas cidades, mas alguém viu que motoristas comuns poderiam revolucionar o transporte.
Bebida energética com gosto esquisito, em lata pequena e cara? Nenhum dado indicaria que isso faria sucesso. Mas alguém viu uma tendência no comportamento dos consumidores e decidiu apostar na ideia da Red Bull.
Se dependêssemos só de dados, o mundo seria previsível e sem inovação. A IA analisa o que já existe, mas só a criatividade e intuição humana enxerga o que ninguém ainda viu.
Dados não são oráculos
Os dados dão segurança. Mas segurança demais gera cegueira. Se você só olha para o que já funcionou, ignora o que pode funcionar no futuro. E é aqui que muitas empresas erram feio.
Você está usando os dados para decisões melhores ou só para confirmar o que já queria? Muita empresa acha que sabe para onde ir, mas essa não é a pergunta certa. O foco não é “onde crescer?”, e sim “como testar antes de colocar grana nisso?”
E tem mais: produtividade e assertividade podem aumentar em até 30% quando integramos dados com visão humana. Só que isso exige três coisas:
- Analisar padrões, mas sem ficar refém deles. Dados preditivos ajudam, mas precisam ser confrontados com experiência real.
- Usar intuição estratégica. Os melhores insights vêm de percepções sutis, humanas, que os números ainda não captaram.
- Testar antes de escalar. Pequenos experimentos evitam investimentos errados e garantem que você está no caminho certo.
O jogo é outro
Empresas inteligentes não seguem relatórios cegamente, mas também não decidem no chute. Elas encontram um equilíbrio.
- Não viram escravas dos padrões. Tendências passadas ajudam, mas inovação nasce do inesperado. Se você só olha para o retrovisor, como vai enxergar uma curva que nunca foi feita?
- Fazem perguntas que os dados não respondem. A intuição é o que diferencia os grandes estrategistas dos bons analistas.
- Testam antes de escalar. Expandir sem um plano validado é como navegar sem bússola. Pode até dar certo, mas o custo da viagem será enorme.
O ponto não é ignorar os dados. É saber quando desafiar o que eles dizem.
Em um mundo onde 95% das decisões tomadas por dados serão automatizadas até 2025, a verdadeira arte da estratégia está em saber quando confiar nos números e quando ouvir a intuição.
E mais: segundo a Gartner, empresas que tratam a IA como "solução mágica" podem acabar reféns de modelos mal calibrados. Diretores de inteligência artificial estão sendo contratados às pressas, e se não forem orientados pela percepção dos CEOs e outros diretores, isso pode resultar em decisões ruins em um futuro próximo.
O futuro pertence a quem sabe equilibrar dados com experiência e intuição
Em vez de seguir cegamente um dashboard repleto de dados, que tal usar um mapa que leve em conta sua intuição, percepção de mundo e experiência de vida?
As empresas que dominam a inteligência de decisões combinam tecnologia com o toque sutil humano e estão à frente do mercado que está preocupado apenas com o próximo DeepSeek.
Elas não apenas extraem insights com ajuda da tecnologia, mas os transformam em estratégias que podem ser aplicadas e geram faturamento real.
E você? Vai continuar seguindo o GPS para chegar em lugares já esperados ou vai começar a dirigir com o apoio do GPS para chegar em lugares surpreendentes?