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Liderar com inteligência artificial não é confiar cegamente no que o algoritmo mostra. É ter discernimento para enxergar o que a máquina ainda não vê. Crédito: Golden Sikorka.

Thiago Muniz

Thiago Muniz

Thiago Muniz é CEO da Receita Previsível Consultoria, professor na FGV em todo o Brasil de marketing e vendas e mentor de negócios.

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O papel da liderança que a inteligência artificial nunca vai assumir

10/09/2025 13:07
A Inteligência Artificial atualiza o CRM, resume as reuniões, envia alertas e sugere os próximos passos. Os dashboards brilham com previsões animadoras. À primeira vista, tudo parece sob controle. O pipeline está cheio, os indicadores apontam crescimento e o time continua batendo ponto nas reuniões semanais. Mas, no fundo, algo incomoda.
Você sente. Não tem dado que esconda.
Aqueles leads que pareciam promissores estão silenciosos demais. A energia do time anda estranhamente baixa. O forecast está lá, bonitinho, mas os negócios não andam. E o que era para ser um processo confiável vira um teatro encenado com dados que só contam parte da história.
É nessa hora que a liderança de verdade se revela. Porque liderar com inteligência artificial não é confiar cegamente no que o algoritmo mostra. É ter discernimento para enxergar o que a máquina ainda não vê. O dado mostra o provável. Mas só quem lidera com inteligência real… aquela que mistura escuta, sensibilidade e contexto… consegue tomar a decisão certa na hora certa.
A inteligência artificial é uma ferramenta poderosa. Mas sem uma liderança capaz de interpretar o invisível, ela só automatiza um processo já equivocado desde o começo. E ainda há um lado pior: ela deixa tudo com cara de profissionalismo, quando, na verdade, o time só aprendeu a repetir o mesmo erro com mais velocidade.

A nova liderança não se mede pela quantidade de dados, mas pela coragem de interpretar o que eles não mostram

Nos últimos anos, a Inteligência Artificial deixou de ser promessa e se tornou rotina. Ela organiza o pipeline, monitora interações, transcreve reuniões, sugere abordagens. Mas, segundo o artigo da Harvard Business Review, “How AI Can Make Us Better Leaders”, é exatamente nesse novo cenário que a liderança mais tradicional começa a perder valor.
A liderança do futuro não é a que sabe tudo. É a que sabe fazer as perguntas certas diante de tanta automação.
De acordo com a Forbes, em “Como a IA está redefinindo a liderança corporativa”, o que se espera dos líderes não é que acompanhem cada movimento do sistema, mas que entendam como pensar junto com ele. A IA acelera o operacional, mas é a liderança humana que ancora o julgamento, o timing e o significado de cada decisão. Ela é a única capaz de responder à pergunta que a IA ainda não entende: “Vale a pena seguir por aqui?”
A McKinsey, em “The State of AI”, reforça essa mesma lógica: empresas que mais se beneficiam da IA não são as que automatizam tudo, mas as que ensinam seus líderes a usar a tecnologia como parceira, não como atalho. Não se trata de mais produtividade, e sim de mais consciência.
E é justamente aí que tantas operações falham. O dado aponta uma direção, mas o líder hesita. Por medo de parecer ultrapassado, abre mão do seu papel crítico e passa a confiar em previsões que ele próprio não validou. O resultado? Um time que executa bem, mas decide mal. Que parece eficiente, mas não é eficaz. Que parece engajado, mas opera no piloto automático.
Liderança com IA não é sobre parecer moderno. É sobre manter a lucidez enquanto o mundo gira mais rápido. E lucidez, em tempos de hype, é o recurso mais escasso e valioso.
A IA executa. Mas quem precisa pensar é você.
Você já deve ter visto isso acontecer,  talvez até na sua própria operação. O pipeline está atualizado. Os dashboards brilham. O CRM mostra negócios "quentes", com sequência de e-mails agendada, próximas interações previstas e tudo rodando como o esperado. Mas alguma coisa está errada. Você sente que a venda não vai fechar. E, mesmo assim, ninguém faz nada.
Esse é o novo teatro moderno da produtividade: dados corretos sustentando decisões erradas.
Segundo o artigo da Harvard Business Review, “AI-First Leadership: Embracing the Future of Work”, a presença do líder e a sua capacidade de discernir o que os dados ainda não mostram é o que separa empresas maduras das automatizadas demais. A IA pode identificar padrões, mas continua cega para exceções. E quem não treina o time para perceber essas nuances está apenas terceirizando decisões que deveriam ser humanas.
A Você RH, em “Os impactos da inteligência artificial no papel dos líderes”, alerta para outro ponto importante: a IA está assumindo tarefas operacionais com maestria, mas os líderes que não acompanham a mudança de papel deixam o time à deriva. É o líder quem deve apontar os desvios, confrontar a passividade e ensinar o time a sair do automático.
É nesse ponto que muitas lideranças, mesmo bem-intencionadas, falham. Em vez de interpretar o dado, elas obedecem ao dashboard. Em vez de ensinar o time a refletir, exigem cumprimento da cadência. Em vez de desconfiar do “deal quente demais”, validam previsões só porque o CRM diz que está tudo certo.
Mas a inteligência artificial não entende hesitação no tom de voz. Ela não percebe o silêncio de um cliente antes seguro, agora evasivo. Ela não detecta quando o SDR, mesmo bem treinado, começa a agir sem convicção. Só quem lidera com presença, de fato, consegue fazer isso.
E se você abrir mão desse olhar, se tornar apenas o “guardião dos números”, seu time continuará operando com excelência, mas sem resultado.
Liderar com I.A é sobre presença, contexto e coragem de decidir.
Em tempos em que os dados já tomam a frente das análises e a Inteligência Artificial preenche automaticamente o CRM, muitos líderes começam a acreditar que podem apenas acompanhar as métricas à distância. Afinal, a IA resume reuniões, pontua oportunidades e até projeta riscos com precisão. Para que se envolver, se o sistema “faz tudo”?
Mas a verdade é que nenhum algoritmo enxerga o que só um ser humano, presente e atento, consegue sentir. O time não entrega porque está cansado? O decisor do cliente mudou e ninguém percebeu? A proposta enviada perdeu o timing porque o contexto do lead mudou? Isso não aparece nos dashboards. Só aparece para quem está dentro da operação, observando além do óbvio.
Segundo a Harvard Business Review, no artigo “How AI Can Make Us Better Leaders”, o líder do futuro é aquele que desenvolve a habilidade de interpretar o que a IA ainda não consegue captar: contexto, empatia e nuance. Isso não significa se opor à tecnologia, mas usá-la para libertar tempo e energia  e assim poder liderar de verdade.
A Forbes Brasil, em “Como a IA está redefinindo a liderança corporativa”, reforça esse ponto ao afirmar que a I.A. não substitui o papel de inspirar, decidir com ambiguidade e desenvolver talentos. Esses continuam sendo domínios humanos, especialmente importantes quando a automação cresce.
Na prática, as operações que escalam com inteligência são lideradas por quem sabe usar a IA como uma lente, mas nunca como um espelho. Porque a IA mostra o que já aconteceu. Mas só o líder enxerga o que está prestes a acontecer  e age antes.

O futuro da liderança não é técnico. É humano, com suporte técnico.

Muita gente ainda imagina que liderar com I.A significa dominar ferramentas, aprender a programar prompts ou analisar dashboards em tempo real. Mas a liderança do futuro não é sobre saber operar o sistema. É sobre interpretar aquilo que ele ainda não mostra e conduzir o time em meio às incertezas.
A Harvard Business Review, no artigo “AI-First Leadership: Embracing the Future of Work”, define que a liderança eficaz nesse novo contexto exige presença emocional, pensamento sistêmico e coragem de experimentar, muito mais do que domínio técnico. A IA pode antecipar padrões, mas ainda não dá sentido a eles. Isso continua sendo papel do líder.
Esse é o ponto cego de muitas organizações hoje. Elas evoluíram nas ferramentas, mas ficaram estagnadas na cultura. Cresceram em velocidade, mas perderam profundidade. Implementaram I.A. antes de formar líderes capazes de usá-la como alavanca.
Por isso, liderar com I.A. exige mais do que usar dashboards bonitos. Exige decidir, ajustar e ensinar. Exige ouvir o silêncio da equipe. Perceber o desconforto escondido nos resultados medianos. Reunir o time não só para cobrar, mas para aprender juntos.
Porque enquanto a tecnologia evolui, os desafios humanos continuam os mesmos: manter o time engajado, tomar decisões difíceis, e fazer com que a equipe acredite, de verdade, no caminho que está sendo construído.

Se a sua liderança sente que o time está rodando, mas não avançando… talvez seja hora de parar e pensar com mais critério.

Você não precisa automatizar tudo.Nem virar um especialista em IA da noite para o dia.
Mas pode começar a reorganizar seu time com base no que mais importa:
clareza de papéis, critério para decidir e rituais que conectam dados com contexto.
É assim que operações B2B saem da falsa sensação de eficiência para uma estrutura que de fato sustenta o crescimento.
Porque no fim das contas, a liderança que permanece não é a que tem todas as respostas. É a que sabe fazer as perguntas certas. Que enxerga além dos relatórios.
Que confia no que os números mostram, mas também no que o silêncio revela.
A inteligência artificial pode prever o que vem a seguir.
Mas só a liderança humana decide o que merece continuar.