Henrique de Aquino Pereira*
NRF: Retail’s Big Show
NRF: o varejo no mundo em transformação
Nova York, nos Estados Unidos, mais uma vez foi palco para a NRF: Retail’s Big Show. O evento, realizado anualmente pela National Retail Federation, reúne os principais nomes do setor para debates, palestras e apresentações de cases de sucesso e aponta tendências para os próximos anos.
Neste ano, havia grande expectativa em saber os principais temas, devido a pandemia e suspensão do evento no ano anterior. Aliado a isso, a mudança de hábitos da sociedade e a evolução da tecnologia trazem significativas mudanças e impactam o varejo, que sem dúvida, está na vanguarda da transformação.
O evento surpreendeu e trouxe como destaque a capacidade do varejo americano em se adaptar rapidamente ao novo contexto e se sobressair, não só pelos números (crescimento de 6,9% no último trimestre de 2021), mas como o principal setor na contribuição do PIB americano. Os principais insights do evento foram: o novo ambiente de negócio, desde o novo consumidor, a cadeia de suprimentos, o papel da loja física até os ecossistemas de negócios; e as tendências Tech.
O novo ambiente de negócio destaca a necessidade do varejo de se adaptar aos novos hábitos dos consumidores. O mundo mudou e o varejo precisa acompanhá-lo. Um exemplo disso foi uma pesquisa feita com trabalhadores americanos na qual 100% responderam que não pretendem retornar ao escritório cinco dias na semana; 60% só desejam trabalhar metade da carga horária no escritório; e 40% apenas 25% do tempo. Esses dados apontam mudanças em aglomerações demográficas, o que interfere na decisão sobre abertura de novos pontos de venda.
Outro desafio é a necessidade de adaptar-se as diversas gerações que convivem ao mesmo tempo na sociedade, mas com anseios distintos. Os hábitos da geração Z foram destaque na NRF 2022. Como já correspondem a quase 40% da população mundial, os Gen Zs estavam no centro do debate das tendências futuras. Considerados como nativos digitais, utilizam um formato não-linear para fazerem compras que vão desde dark stores até meios de pagamentos não-convencionais (como criptomoedas). Outra característica dessa geração é ter nas redes sociais sua principal fonte de inspiração para o consumo, sendo que 97% tomam suas decisões de compras baseadas nas redes.
Nesse contexto de novo ambiente de negócio, a cadeia de suprimentos deixa de ser uma agenda tática e passa para foco estratégico. Nos últimos anos, a oferta atendia a uma demanda histórica de 3% de crescimento anual. No entanto, o problema atual concentra-se na logística e não na produção. Por isso, a necessidade de se reinventar e inovar na cadeia de suprimentos. A Amazon é um bom exemplo que já vinha alinhada às tendências, verticalizou a cadeia de distribuição e se tornou a quinta maior transportadora logística do pacífico. Para isso, constroem os próprios contêineres e mantém aeronaves (já possuem mais de 95 aviões), 50 mil carretas, 260 centros de distribuição e 400 mil motoristas em todo o mundo. Os números impressionam e o objetivo é audacioso, estar a no máximo 15 minutos dos seus clientes.
A loja física, ao contrário do que se pode pensar, não perde relevância. Mantém um importante papel estratégico. Serviços que trazem recorrência (fluxo contínuo de clientes) e utilização do ponto de venda como hub de distribuição são importantes papéis da loja. No entanto, para que funcione é necessário um olhar integrado, foco no cliente e novas métricas de desempenho para a loja. A Best-Buy é um exemplo de como a reinvenção trouxe para dentro das lojas hubs das marcas, suporte técnico e experimentação de produtos.
Uma grande tendência do mercado que foi destaque no evento foi o crescimento dos ecossistemas de negócio. Os grandes ecossistemas e suas plataformas digitais veem dominando o varejo e é de fundamental importância que as empresas consigam se posicionar – seja como um ecossistema (marketplace) ou como parte (seller) de um (ou vários) – como um caminho inevitável para o desenvolvimento do negócio. O Alibaba e o Mercado Livre, como principais ecossistemas do varejo, priorizam foco no cliente, uso intensivo de dados, tecnologia própria e colaboração com os parceiros.
O ESG (Enviromental, Social and Governance) também foi assunto no NRF. Tema muito relevante no mercado americano, seja pelos movimentos sociais que tiveram George Floyd como estopim, seja pela pandemia da covid-19, fato é que ambos foram catalisadores para o tema. Assim como a transformação digital não acontece se for iniciativa exclusiva do TI, a agenda de ESG não acontece se não houver comprometimento da liderança e mudança da cultura empresarial. Essa agenda dialoga com os anseios do novo consumidor e não se trata apenas de posicionamento institucional, mas de como utilizá-lo a favor de negócios e produtos. Um bom exemplo é a Whole Foods, cadeia de varejo alimentar que foi comprada pela Amazon e utiliza esse posicionamento em produtos dentro da loja.
Em relação as novas tecnologias, o que se pôde ver foi um olhar muito realístico, trazendo luz para três focos claros e práticos. O primeiro é a eficiência operacional – com ênfase em aumento de produtividade onde foram demonstradas uma infinidade de soluções robóticas, seja para centros de distribuições ou para pequenas lojas com escalabilidade. O segundo foi a identidade digital, que vai muito além do e-commerce, passa por integrar compras, entretenimento, comunicação e posicionamento das lojas físicas alinhados ao propósito da marca.
O terceiro, com bastante evidência nas discussões do evento, foi o metaverso. Apesar de (ainda) não estar maduro para o varejo, já se apresenta como um universo de oportunidades. Considerado como a evolução do e-commerce, representa um novo pilar do comércio omnichannel. Na ocasião, foram apresentados os cases da NikeLand e da Ralph Lauren, que passaram a desenvolver roupas no metaverso para serem experimentadas pelos clientes no ambiente virtual antes de irem para as lojas.
Enfim, o que pude observar foi um varejo muito centrado no cliente e trazendo suas necessidades para as decisões estratégicas das empresas. A tecnologia sendo cada vez mais uma ferramenta e sua aplicabilidade se tornando mais relevante que a tecnologia em si. Quando reunimos estes dois elementos, vemos o uso intensivo de dados, foco em eficiência operacional e, principalmente, uma ênfase sobre como melhorar a experiência de compra, seja ela física ou digital, e indo além, tentando tornar esta divisão cada vez mais imperceptível e fluida.
*Henrique de Aquino Pereira ingressou no Itaú BBA em 2007 e, atualmente, é superintendente de Meios de Pagamentos & Banking as a Service. Em sua trajetória profissional, trabalhou no Bank Boston e no Citibank. É formado em Ciências Contábeis pela Unisa, pós-graduado em Derivativos pela BM&F Bovespa (agora B3) e possui MBA em Finanças pelo Insper.