Thiago Muniz
Thiago Muniz é CEO da Receita Previsível Consultoria, professor na FGV em todo o Brasil de marketing e vendas e mentor de negócios.
Vendas e marketing
Previsibilidade em vendas: quando o acaso sai mais caro que o planejamento
Existem milhares de conteúdos na internet que ajudam empresários e profissionais a desenvolver habilidades de vendas e marketing. O grande desafio é que, em um mundo saturado de informações, muitas vezes falta a habilidade de transformar conteúdos, dados e informações em insights acionáveis que geram resultados reais. A oportunidade e diversidade de conteúdos gera muitas opções mas também uma certa paralisia, uma barreira para tirar do papel tantas boas ideias. Quando pensamos em agir o cenário mudou e sempre acabamos sentindo que ficamos para trás.
Vivemos em mundo imprevisível e pouca gente se dá conta, mas existe uma lacuna gigante entre consumir informação e realmente praticar o que se consome. Você já pensou sobre isso?
Estamos na era dos CRMs inteligentes, das automações de marketing, do poder dos dados em tempo real, e ainda existem empresas que acreditam que bons resultados de vendas acontecem só empilhando pessoas na área comercial ou investindo em mídia ou publicidade.
Vendedor que segue processos ou que vende bem?
Uma das coisas que chama a atenção também nessa era de desafios invisíveis é o dilema: ter um vendedor que segue processos ou ou ter vendedores que vendem bem? Muitas vezes as empresas falham em acreditar que uma característica anula a outra. Sorte ou talento individual também são boas justificativas para decidir não mexer na sua estrutura comercial. O resultado? Terminar o mês torcendo para bater metas. É comum ver empresas para trocar a sua agência de marketing, escolher novas ferramentas, investir até em workshops e eventos de marketing e vendas, mas muitas vezes falta olhar para onde realmente a coisa trava ou funciona.
Isso acontece porque nesse mundo com tantas opções de informação, o que é maravilhoso por um lado mas também desafiador por outro, procuramos respostas fáceis e rápidas para questões complexas e subjetivas. O que é mais fácil de trocar? O CRM ou enfrentar uma resistência interna onde o time não usa a ferramenta atual?
A consequência é um ritmo onde a sua equipe trabalha no modo "bombeiro", apagando incêndios diários. Lógico, sempre se pode usar argumentos como "nosso time de vendas é experiente e dá resultado".Discurso até mesmo válido em alguns cenários, mas que só funciona até o momento em que seu melhor vendedor decide sair e ir para o concorrente ou o mercado passa por uma transformação inesperada.
"Receita" de vendas
Há alguns dias, conversei com um CEO sobre a implementação de processos para construir receita previsível. Uma empresa com dezenas de vendedores. O diretor comercial, adepto do "sempre foi assim", somou rapidamente alguns números. Custo de implementação do novo processo, custo de treinamento da equipe, custo de novas ferramentas, multiplicou por 12 meses e chegou a um número que, confesso, me fez sorrir. Já com o valor em mente me perguntou: "com esse investimento eu poderia contratar mais três vendedores seniores, aumentar meus investimentos em mídia e quem me garante que estruturar processos vai me render mais que aumentar a equipe e colocar mais dinheiro em tráfego pago?"
Uma pergunta que esconde uma armadilha perigosa em sua aparente simplicidade. É como comparar a compra de uma bomba d'água com o investimento em um sistema de irrigação. A bomba resolve o problema imediato - você consegue mais água agora - mas o sistema de irrigação transforma a maneira como você cultiva. Quando optamos pelo resultado rápido e aparentemente mais "concreto", como apenas aumentar a equipe sem estruturar processos, plantamos uma semente perigosa. É aquela velha história do fazendeiro que preferia contratar mais colhedores em vez de melhorar seu sistema de plantio - no curto prazo colhia mais, mas a cada safra via sua terra menos fértil e sua produção mais instável.
Quanto vale ter um pipeline de vendas previsível e uma equipe que trabalha com método ao invés de instinto? Qual é o preço de contar com pessoas normais, sem depender do “vendedor super herói"? É como perguntar quanto vale ter um solo fértil e irrigado versus uma equipe maior de colhedores em um terreno cada vez mais árido. A primeira opção demanda mais planejamento e investimento inicial, mas cria bases sólidas para um crescimento sustentável. A segunda parece mais segura e imediata, mas esconde custos invisíveis que, como ervas daninhas, crescem silenciosamente até comprometerem toda a safra.
Acho que para entender isso cabem outras perguntas:
- Qual o custo de perder uma oportunidade porque seu vendedor está ocupado "apagando incêndios" em vez de seguir um processo estruturado?
- Quanto sua empresa deixa de vender porque depende exclusivamente do talento individual, sem um processo replicável que permita escalar?
- Qual é o preço de ter vendedores que vendem cada um do seu jeito e não compartilham informações sobre o que estão vivendo na prática porque não se sentem seguros em “entregar o ouro” do que estão fazendo?
- Quanto custa treinar um novo vendedor quando não existe um processo claro para ele seguir? Qual o tempo perdido até que ele atinja a produtividade ideal?
- Quanto sua empresa perde em negociações mal conduzidas, descontos desnecessários ou oportunidades mal qualificadas por falta de um processo estruturado?
Se tem esses números, e são apenas alguns que levantei rapidamente, pode compará-los com o custo de implementação de um processo de construção de uma máquina de vendas. A verdade é que é muito difícil que apenas aumentar a equipe projete resultados melhores a médio e longo prazo. Considerando ainda um mundo onde cada vez mais a inteligência artificial cria a capacidade de criarmos uma “cópia infinita” de tudo que é criado pela manhã, seu concorrente pode durante a tarde capturar e copiar rapidamente.
É desconfortável, é invisível e complexo de resolver.
Apresentei esse diretor comercial para um ex-cliente de consultoria de vendas em um evento. Observei enquanto os dois diretores comerciais conversavam:
O diretor tradicional respondia o meu ex-cliente:
— Entendo que tudo que está sendo falado é importante, mas não consigo justificar investir em processos e trocar ferramentas agora. Fico imaginando gastar todo esse dinheiro para depois de meses ou anos demonstrar resultados ou ainda treinar meus vendedores em técnicas que eles podem acabar levando para a concorrência.
Meu ex-cliente retrucou:
— Interessante, agora imagina outra opção: você não investe em processos e tecnologia e seus vendedores, sem método e estrutura, decidem ficar. O quanto você perde por não enxergar o que poderia ajustar na sua operação?
O ex-cliente trabalhou conosco durante um ano, completando o ciclo inicial de implementação da máquina de vendas. Ele descobriu que processos bem estruturados são como uma bússola e um mapa para um navegador: instrumentos essenciais para manter o rumo em qualquer condição. Enquanto o imediatista é como um capitão que muda sua rota toda vez que vê uma onda mais forte, o profissional consistente é como um navegador experiente - usa seus instrumentos, entende os padrões do mar e faz ajustes calculados para manter o navio no curso certo, independente das condições.