Por Susana Falchi*
Gestão de crise
Remuneração dos executivos segue imune a Covid-19, mas ameaça saúde das empresas
O comportamento de muitas empresas neste período de pandemia tem servido para comprovar, mais uma vez, que há sempre uma distância significativa entre discursos feitos na hora da emoção e a prática. Da mesma forma, nem tudo o que se aplica ao chamado ‘chão de fábrica’ serve para as ‘salas da chefia’.
De uma forma geral, enquanto muitas companhias aproveitaram a flexibilização das leis trabalhistas para reduzir jornadas, salários e antecipar férias dos níveis hierárquicos mais básicos, do ponto de vista do alto escalão, pouco foi feito no sentido de contribuir para preservar a saúde financeira das organizações neste momento de crise.
Apesar das notícias dando conta de que alguns diretores executivos, em uma demonstração de solidariedade, renunciaram uma parte de sua remuneração, uma pesquisa da consultoria americana CGLytics, com mais de três mil empresas listadas em bolsa, revela que o sacrifício foi mínimo.
De acordo com o levantamento, os cortes foram mais focados nas remunerações variáveis, mantendo a base da folha de pagamentos intacta. Mesmo entre as empresas que cortaram os salários dos executivos, dois terços delas não enxugaram mais do que 10% desse valor.
No atual contexto da pandemia, e consequente crise econômica em escala global, as empresas precisam ajustar suas prioridades e repensar a maneira de conduzir os negócios. O modelo de remuneração dos executivos é um dos processos que necessita ser revisto para garantir o alinhamento com as novas estratégias e prioridades empresariais.
No mercado brasileiro houve uma redução de aproximadamente 20% nos salários praticados para novas contratações em todos os níveis, com o objetivo de reduzir custos e garantir a sobrevivência dos negócios.
A necessidade de reinventar os negócios, ação impulsionada pelas incertezas de uma pandemia que já deixou a marca irreversível de mais de 150 mil mortos no país, e uma taxa de desemprego recorde, demanda das empresas uma atenção maior a métricas ESG (ambientais, sociais e de governança).
É preciso responsabilidade nas tomadas de decisões para que a política de remuneração traga, de fato, impacto positivo para a organização e a comunidade.
As empresas podem ir além do básico e oferecer outro tipo de incentivo à produtividade. Trabalhar a marca do empregador, ou o employer branding, torna-se um grande diferencial. Outras soluções passam pela melhoria do ambiente de trabalho, aumento das oportunidades de crescimento e das chances de desenvolvimento com novos modelos de liderança e outras iniciativas que compõem um arsenal imprescindível para atrair novos talentos e reter os já existentes.
Trazer indicadores que expressem o impacto das altas remunerações no negócio também se torna uma prioridade. Urge revisar métricas financeiras associadas às metas de desempenho, apropriando-se de uma abordagem mais balanceada, também como forma de atender ao princípio da equidade.
O ambiente corporativo vive um momento de revisão conceitual de diversas práticas de governança empresarial. Neste sentido, a gestão de pessoas, sem dúvida, é um pilar extremamente relevante para retomar o ciclo virtuoso de crescimento que o país precisa.
Obter o máximo de engajamento de todos os níveis hierárquicos nesse processo significa proteger a saúde financeira da companhia.
*Susana Falchi é vice-presidente da Orchestra Soluções Empresariais e CEO da HSD Recursos Humanos