Em 2024, eu e minha esposa fizemos uma viagem de motorhome pela Islândia. Era quase tudo perfeito. Estradas sem movimento, bem cuidados e que, praticamente, chegam na beira dos monumentos naturais. Campings organizados, estrutura pensada para receber viajantes sobre rodas. Rodamos quase 2 mil km com a sensação de que a natureza e a infraestrutura estavam trabalhando em conjunto para nos proporcionar uma experiência memorável.
Como todo viajante, voltamos empolgados e querendo proporcionar o que vivemos aos filhos. E, desde então, começamos a planejar uma road trip pelo Chile. A expectativa era que fosse parecida. Só que a estrada nos ensinou, mais uma vez, que a realidade — e a vida — não seguem roteiro.
De Santiago até o início da Patagônia Chilena, foram 900 km de quase nada, exceto pelo Salto del Laja. A cultura do motorhome praticamente inexistente nos obrigou a passar a noite em um posto de gasolina, por exemplo. Afinal, fora da temporada de verão ou neve, os campings estavam quase sempre fechados.
E, com isso, veio o primeiro aprendizado: o desafio não era chegar, era manter a motivação viva no caminho. No segundo dia, chegando em Pucón, com chuva e totalmente deserta, tivemos que nos adaptar. Ou mudamos as coisas, ou essa experiência será um fracasso.
Chegamos tarde e cansados ao destino, mas montamos tudo como se fossemos aproveitar dias ali. Abri o toldo, estendi as cadeiras, fiz uma fogueira e, inclusive liguei um projetor portátil que levei para fazer uma noite de cinema noturno. A tela? A lateral do motorhome. Afinal, não dá para garantir que tudo vai funcionar, mas sem tentar, é claro que não vai.
Minha filha, acostumada ao conforto dos hotéis, precisou adaptar suas referências. Mas o tempo e o espírito da viagem foram ensinando o que é essencial. Já o pequeno de 6 anos — esse foi meu parceiro incansável. Sem filtros, sem expectativas enraizadas como em nós, adultos, ele enxergava o mundo com o brilho de quem vê tudo pela primeira vez. Ele me lembrava do porquê estávamos ali.
Aprendi — ou melhor, reaprendi — que há sempre quatro chaves em qualquer jornada intensa, seja uma road trip pela Patagônia ou um evento desafiador no trabalho: perceba o problema, converse sobre ele, adapte-se e jogue em equipe. Minha esposa foi brilhante nesse ponto. Dividimos funções. Distribuímos pesos. Criamos juntos.
E como em toda jornada, nosso reset foi chegar ao Lago Calafquén, em Coñaripe. Ali pareceu termos alcançado a razão oculta daquelas estradas longas e monótonas até então. Era a paisagem dizendo: “valeu a pena”. Depois veio Villarica e seu majestoso vulcão, em um dia de sol. E com isso, a sensação de que o desconforto inicial já fazia parte de uma outra narrativa — a de superação.
Então, se você estiver no meio de um projeto, uma viagem, uma fase difícil da vida e nada parecer estar no lugar… faça como se faz com qualquer aparelho eletrônico: retire da tomada, espere alguns segundos e reconecte. Às vezes, é só disso que a gente precisa. Funciona com tecnologia. Funciona com projetos. Funciona com pessoas também.