
Thiago Muniz
Thiago Muniz é CEO da Receita Previsível Consultoria, professor na FGV em todo o Brasil de marketing e vendas e mentor de negócios.
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Por que suas vendas presenciais não performam como deveriam
Você já teve a sensação de que algo não está funcionando, mas não consegue apontar exatamente o quê? Os números de vendas não caíram drasticamente, mas estagnaram. Os vendedores estão em campo, visitando clientes, apresentando bem, conhecem o produto, têm experiência. Mesmo assim, os resultados não progridem.
Essa fricção entre esforço e resultado tem se tornado comum em vendas presenciais. O comportamento do comprador mudou. Hoje, ele chega na reunião com mais informação, mais pressa e menos paciência para discursos genéricos. Como explica o artigo da Harvard Business Review, Building a More Adaptable Sales Force, "estruturas de vendas rígidas não acompanham a fluidez das decisões de compra no ambiente digital."
O mesmo é apontado pela Forbes no artigo The New Economics of Field Sales, que demonstra como organizações estão reestruturando seus times de campo para operar com mais eficiência, reduzindo deslocamentos e apostando em abordagens mais inteligentes.
Se a sua equipe ainda depende exclusivamente de visita e roteiro, pode estar presa em um modelo que já não converte com a mesma força.
A pergunta que fica é: quanto tempo a mais você vai esperar para ajustar esse formato?
Quando os dados mostram o que a rotina insiste em ignorar
A mudança não é mais uma tendência, é uma realidade confirmada por dados. Segundo o relatório Virtual Selling’s Long-Term Impact on Field Sales Deployments, da Gartner, até 2025, 80% das interações entre vendedores e compradores B2B ocorrerão em canais digitais. Isso não significa o fim da venda presencial, mas sim a necessidade de reposicioná-la dentro de uma estratégia mais fluida, conectada e centrada no comportamento do cliente.
E os números não param aí. Como mostra o artigo da Forbes, The New Economics of Field Sales, empresas que adotaram abordagens híbridas de vendas, combinando visitas presenciais com canais digitais, observaram um aumento de até 50% na velocidade de resposta e no engajamento comercial, além de redução de custos operacionais.
O que esses dados revelam é simples: não se trata de substituir o presencial pelo digital. Trata-se de integrar, reequilibrar, redirecionar esforços e criar uma máquina de vendas adaptada a uma nova lógica de decisão.
Como destaca a Harvard Business Review no artigo How B2B Businesses Can Get Omnichannel Sales Right, empresas B2B que souberam redesenhar a experiência do cliente em múltiplos canais são as que estão mantendo relevância e crescendo em mercados competitivos.
Quando o vendedor vai preparado, mas o cliente já chegou decidido
O problema das vendas presenciais não está na visita em si está na expectativa que a empresa ainda deposita nela. Em muitos negócios B2B, a visita física continua sendo tratada como o ponto alto da jornada comercial, quando, na verdade, ela já não ocupa mais esse lugar na cabeça do comprador.
O cliente atual não espera ser convencido apenas no momento da reunião. Ele já passou por múltiplos pontos de contato digitais, construiu suas próprias impressões, comparou propostas e, em muitos casos, já tomou uma decisão preliminar antes mesmo de ouvir seu vendedor.
É nesse ponto que a venda presencial perde força: quando o vendedor chega carregando um discurso repetido, técnico, e desconectado da real maturidade daquele lead. Como mostra o relatório Virtual Selling Skills – Gartner da Gartner, o vendedor moderno precisa dominar novas habilidades como contextualização, escuta estratégica e adaptação em tempo real para ter impacto nas interações presenciais.
O problema, portanto, não é estar em campo. É estar lá sem preparo para lidar com um cliente mais informado, mais exigente e com menos paciência para abordagens previsíveis.
Essa desconexão entre o que a empresa acha que está entregando e o que o cliente realmente percebe está no centro da estagnação de muitas equipes de vendas externas.
Veja o contraste:
Antes do virtual: O Field Sales era o protagonista absoluto. A venda dependia quase exclusivamente da presença física, da conversa bem conduzida e do relacionamento cultivado no café ou na visita à fábrica. A proposta era entregue pessoalmente, e o convencimento acontecia cara a cara.
Com o virtual: O cliente já chega com informações. O processo começa bem antes da visita, passa por canais digitais e exige alinhamento com marketing, dados e discurso personalizado. O Field Sales continua essencial, mas como finalizador estratégico e não mais como único responsável pela construção da oportunidade.
Como transformar a presença em performance: ações práticas para destravar seu Field Sales
Antes de avançar, vale reforçar o conceito de cada modelo: Field Sales é a estratégia de vendas baseada em visitas presenciais, geralmente voltada para negociações complexas, de maior valor e com maior necessidade de relacionamento.
Já Inside Sales se refere ao modelo de vendas remotas, em que o vendedor atua por telefone, videoconferência ou e-mail, com processos geralmente mais rápidos, repetíveis e baseados em dados. São abordagens complementares que, quando bem integradas, ampliam o alcance e a eficiência comercial.
Compreender essas diferenças conceituais entre os modelos é essencial para agir com mais clareza. Diagnosticar o problema é o primeiro passo. Mas transformar a rotina de vendas presenciais exige ação coordenada entre estratégia, treinamento e alinhamento.
A seguir, algumas direções práticas que podem ser aplicadas mesmo em equipes que ainda operam com estruturas tradicionais:
- Reestruture o papel da visita: A visita não pode mais ser tratada como o momento de descoberta. Ela precisa ser uma continuação lógica do processo comercial iniciado no digital. Vá para a reunião com informações do lead já analisadas, hipóteses levantadas e argumentos moldados à realidade daquele cliente. O vendedor precisa estar preparado para validar, aprofundar e conectar – e não apenas apresentar.
- Crie rituais de alinhamento entre Inside e Field Sales: As equipes não devem atuar em paralelo. Reuniões quinzenais ou mensais para discutir discurso, status dos leads e histórico de objeções ajudam a sincronizar a abordagem. Como mostra o artigo da Harvard Business Review, A Better Way to Link Sales and Marketing, empresas que criam canais reais de troca entre os times geram mais eficiência e previsibilidade.
- Treine soft skills com a mesma disciplina que treina produto: A escuta ativa, a contextualização do discurso e a leitura do comportamento do comprador não são talentos inatos são habilidades que podem e devem ser desenvolvidas. O relatório da Gartner, Build Key Seller Skills for Successful Virtual Selling, destaca que a capacidade de traduzir dados em conversas relevantes e adaptáveis é uma das competências mais críticas para vendedores em campo.
- Faça da inteligência comercial uma aliada do presencial Aproveite ferramentas e dados do marketing, CRM e plataformas de engajamento para mapear o comportamento prévio do lead. O vendedor de campo precisa entrar em cena com o histórico e contexto construído, sabendo quais dores foram sinalizadas, quais páginas foram acessadas e que tipo de material o cliente consumiu antes da reunião.
Transformar o Field Sales não significa abandonar a presença significa dar propósito a ela. A presença física é poderosa, mas só entrega resultado quando bem posicionada em um fluxo comercial mais inteligente, conectado e estratégico.
Como planejar o uso do presencial para fechar mais negócios
O maior risco das equipes de vendas presenciais hoje não está no canal, mas na repetição de comportamentos que já não combinam com a realidade do comprador atual. Muitos times operam como se estivessem em 2015, acreditando que o esforço presencial, por si só, justifica a conversão. Mas isso já não é verdade. O cliente quer coerência, e não insistência.
Planejar o uso do presencial exige um tipo diferente de liderança. Em vez de cobrar número de visitas, é hora de medir profundidade de interação. Isso significa rever KPIs, ajustar rituais de acompanhamento de pipeline e dar mais autonomia estratégica ao vendedor de campo.
Empresas que integram marketing, vendas internas e externas criam uma narrativa contínua e sem ruídos, que guia o comprador do primeiro clique à assinatura do contrato. Presença sem propósito é custo. Presença conectada com dados e contexto é influência. E influência fecha negócios.