Millena Queiroz Prado

Investimentos menos desiguais

Lideranças femininas ganham espaço à frente das startups

23/02/2020 11:00
No começo do mês, uma matéria escrita pela Claire Diaz-Ortiz e veiculada pela TechCrunch — da qual inclusive participei, reúne algumas pesquisas de mercado interessantes que mostram como o impacto da presença de lideranças femininas em startups estão performando acima da média e sendo responsáveis por gerar bons retornos para empresas de venture capital que investiram na América Latina.
A consultoria americana Boston Consulting Group mostra que startups fundadas por mulheres geram 2,5 vezes mais receita por dólar levantado junto a investidores do que aquelas fundadas por homens. Outro estudo, este do First Round Capital, mostra que empresas fundadas estritamente por mulheres registraram desempenho 63% melhor do que aquelas com equipes fundadoras eminentemente masculinas.
Neste sentido, é interessante o exemplo da Theia, startup brasileira fundada pelas empreendedoras Flavia Deutsch e Paula Crespi. Em meados do ano passado, quando elas estavam levantando investimentos para sua plataforma B2B que apoia mães e pais em suas principais necessidades, decidiram rejeitar alguns cheques de investidores homens, mesmo sendo até mais fácil convencê-los a assinarem os maiores valores.
A Theia, por sinal, marcou o ano passado ao se tornar a companhia fundada apenas por mulheres a conseguir levantar o maior valor em investimentos de 2019 - e suas investidoras combinaram de não abrir mão da proporção de, para cada investidor homem que colocasse dinheiro, houvesse também a participação de uma investidora mulher.
E não
foi por ideologia, ou pelo menos não apenas por causa dela. Um outro estudo, da
fundação Ewing Marion Kauffman, divulgou que o retorno do investimento obtido
em empresas lideradas apenas por mulheres é 35% mais rápido em relação àquelas
lideradas majoritariamente por homens.
E não somente nas empresas ancoradas em mulheres está o futuro, como também na diversidade de fundadores. Os investimentos feitos por companhias lideradas por homens e mulheres é outro fenômeno que está em alta na América Latina: correspondeu, em 2019, a 16% dos dólares investidos no continente. 
Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, essa porcentagem é de apenas 9% e, na Europa, 8%. Esse número da América Latina inclui US$ 400 milhões colocados no Nubank, que se tornou o principal unicórnio brasileiro, cofundado por Cristina Junqueira — que, por sinal, estava grávida na época.
À frente de mais de 40 investimentos em startups, lido com founders homens e mulheres e, apesar dos números, não acredito que o gênero possa definir se um negócio irá ou não dar certo. Ainda assim, sou defensora da diversidade no board das empresas que investi, porque entendo que contar com diversos pontos de vista diferentes colocados na mesa torna as decisões mais assertivas e pertinentes. Pessoas que pensam diferente de nós trazem outras visões do mercado e, frequentemente, nos mostram aspectos que não conseguimos enxergar sozinhos.
Quando comecei, praticamente não havia mulheres investindo em startups no Brasil, éramos menos de 1% das investidoras-anjo e a principal dificuldade que enfrentávamos era justamente acreditar em nós mesmas. De lá para cá, empreendi, me tornei protagonista em minha vida e muita coisa mudou, fundei o MIA - Mulheres Empreendedoras Anjo, o Gávea Angels, a G2 Capital, voltei-me para os meus próprios negócios, consolidei a operação de meus grupos empresariais.
Em vez
de mencionar as dificuldades enfrentadas, portanto, sempre prefiro falar das
conquistas. Acredito no valor da diversidade para o desenvolvimento de negócios
inovadores. Em 2019, os investimentos em empresas com equipes fundadoras
mistas, feminino-masculino, representaram 16% dos dólares investidos na América
Latina, 9% nos EUA e apenas 8% na Europa. No geral, o investimento total em
equipes masculinas e femininas mistas representou 17% do total investido na
América Latina, 13% nos EUA e 9% na Europa.
E é
nesse ponto que se torna ainda mais importante este ciclo virtuoso que está
acontecendo na América Latina: mulheres e homens investidores atuando em
sinergia e acreditando nas empresas que, por sua vez, tem dado retorno cada vez
maior.
Estes
movimentos de saída acontecendo mais rapidamente e de forma coordenada farão,
por sua vez, as relações de investimento se tornarem gradualmente menos
desiguais e a roda da economia girar mais rápido e de forma mais democrática. É
ou não é o cenário que todos nós buscamos?