Camila Farani
Investidores criteriosos
ESG: o que esperar da sigla que está mudando o mundo empresarial em 2021?
Certa vez li de um executivo americano que, há 15 anos, investir em empresas com compromissos socioambientais e de boa governança era considerado muito mais um comportamento de "bom-mocismo investidor" do que uma boa perspectiva de negócio.
Quando ele se sentava à mesa para discutir perfis de carteiras mais rentáveis, por exemplo, normalmente ficavam em segundo plano temas como impacto socioambiental causado pelos produtos, serviços ou processos produtivos da empresa em questão, como era composto o seu conselho — se era diverso ou não — e mesmo suas práticas de governança. Esses elementos não eram considerados diferenciais no potencial de uma empresa.
Essa realidade não existe mais. O conceito de governança ambiental, social e corporativa (ou ESG na siga em inglês para environment, social, governance) evoluiu de item acessório a essencial e passa a ser observado com muita atenção pela comunidade investidora.
Em linhas gerais, as demandas crescentes dos consumidores por empresas socialmente responsáveis vêm ajudando a fazer com que sustentabilidade e outros temas envolvidos em ESG se materializem mais do que nunca como perspectivas concretas de negócios, e isso deve ser refletido cada vez mais no portfólio dos fundos de investimento nos próximos anos.
A lógica da preocupação com ESG por parte dos investidores obviamente acompanha as demandas do mercado consumidor. Uma pesquisa da KPMG International mostra que 27% das pessoas, ao considerarem compras no setor alimentício ou varejo, consideram a questão da sustentabilidade mais relevante hoje do que antes da Covid-19.
Além disso, 30% das pessoas julgam mais importante a abordagem em relação ao meio ambiente, e 31% entendem como fundamental a consciência da marca, ambos no cenário pós-pandemia. Ou seja, se esse movimento que engloba questões do ESG já se traduz em números também por parte dos consumidores, naturalmente reflete em novas oportunidades de negócios para as empresas e para os acionistas. E aqui, vale fatiar o conceito em três.
No "E" de environment, relativo a aspectos relativos à sustentabilidade e impacto no meio ambiente, observa-se por exemplo o crescimento de preocupações com gestão responsável de recursos naturais, preferência pelo uso de tecnologias limpas, reciclagem de produtos e redução de emissões de gases tóxicos e a ascensão de construções inteligentes e verdes.
O "S" traz crescentes alertas sobre aspectos sociais, como relações de trabalho, condições de bem-estar oferecidas pelas empresas aos seus colaboradores, redução de vieses inconscientes, além do desenvolvimento das comunidades na esteira do processo produtivo de seus produtos ou serviços. Observamos uma redução significativa da tolerância desse consumidor e da sociedade em geral a marcas ou produtos com posicionamentos racistas ou preconceituosos — ainda que atribuídos por elas a deslizes pontuais.
Por último, mas não menos importante, o "G" de governance abrange ainda políticas anticorrupção, compromisso real com diversidade e independência dos conselhos de administração, entre outros fatores.
Um caso interessante que gosto de observar é da marca de roupas para inverno americana Patagonia. Não é de hoje que a empresa investe em aspectos que à primeira vista podem ser considerados um tiro no pé. No entanto, ao contrário, ela tem colhido excelentes frutos em negócios.
Entre suas práticas estão ações de consumo consciente, que prega a reciclagem e o conserto de peças como alternativa à compra de novas unidades (já ouviu falar na campanha "Não compre essa jaqueta"? Vale procurar). A marca também tem parcerias para monitorar as condições justas de trabalho de funcionários da cadeia produtiva, como costureiros, além de mostrar ações concretas de cuidado com o meio-ambiente. O que poderia parecer argumentos anti-vendas, na verdade foi bem recebido pelos consumidores. E, em 2018, a marca bateu valuation de US$ 1 bilhão.
ESG com atributos rentáveis baseados por dados
Um levantamento recente da consultoria CoreData mostrou a relevância crescente do tema entre os investidores. Da amostra de 200 entrevistados, três em cada cinco investidores acreditam que nos próximos cinco anos os gestores de fundos vão agregar fatores de ESG às suas análises e estratégias. Na Europa, esse percentual chega a 72% e, nos Estados Unidos, 50%.
E outra observação importante é como essa preocupação aumentou entre os investidores desde o ano passado. Do total, 60% afirmaram estar mais atentos e com foco dedicado a ESG desde o início da pandemia.
O relatório de tendências feito pela MSCI para 2021 mostra ainda que neste ano os investidores devem aprofundar seu entendimento como os atributos de ESG entregam resultados financeiros reais. Haverá um acompanhamento maior sobre indicadores e métricas socioambientais e de governança e quando os atributos de ESG aplicados por determinada empresa ainda não trazem resultados.
Por outro lado, a demanda de investidores por esses ativos vai crescer, e agora, mais do que nunca, explicações vagas não são mais aceitáveis. Na corrida por ativos com ganhos reais trazidos por estratégias de ESG, os dados nunca estiveram tão importantes. Empresas que conseguirem não apenas mostrar o que fazem, mas quais resultados financeiros efetivos trazem com suas iniciativas, já saem na dianteira.